O que afinal diferencia os homens dos animais? Diz-se que é a capacidade de raciocinar outros o poder de trabalhar e transformar a natureza. Eu, porém não sei o que efetivamente o que nos distingue dos demais seres vivos, mas acredito que a capacidade de sentir e de sonhar são provavelmente as características mais humanas que nós temos. Qual o sentido da vida? Em minha opinião, na falta de uma resposta melhor acho que o sentido da vida é senti-la em toda sua extensão, sorver cada gota, porque no final das contas a vida é pra ser vivida, não assistida. Passei uma boa parte da minha existência como telespectador e cada vez que me sinto, mesmo que profundamente, triste, lembro-me que foi a partir do momento em que me permiti sentir que comecei a ter esta inigualável sensação de estar vivo. Estar nestas condições inclui os bons e maus momentos. Mas quando esta tudo tão ruim (como por exemplo agora rs.) além da vida real temos algo que faz com que, de alguma forma, o ser humano tenha o alento: os sonhos. E o que são os sonhos, de que matéria eles são feitos, o que eles representam? Mais uma pergunta sem resposta, mais um mistério. O fato é que o sonho é matéria que sustenta a própria vida, provavelmente foi do sonho de voar que se criaram aviões, do sonho de conhecer o mundo que se forjou a internet, mas às vezes os sonhos nada mais são do que a realização de nossos mais íntimos desejos, principalmente os que podemos chamar: Impossíveis. Bem, disto isto vamos ao sonho...
Lá estava perambulando pelas ruas do Recife Antigo (área cheia de prédios neoclássicos, mas parece uma cópia velhinha das ruas de Paris do Sec.XVIII), era fim de tarde e havia pouquíssimas pessoas nas ruas. O céu estava multicor predominando aquela coloração laranja escuro manchada por nuvens e o céu azul. Olhando o horizonte era difícil diferenciar o mar e o céu... Mas Felipe cessou de observar o espetáculo diário da natureza ao divisar ao longe uma figura pequena, de cabelos longos, pele branca que estava sentada sozinha na amurada, observando o mar... Por um instante ele acreditou que poderia ser alguém que conhecia... Mas logo desviou o olhar e seguiu adiante. No entanto, a idéia que aquela figura feminina poderia ser Ela martelava sua cabeça e a cada pancada ele reduzia seu passo tentado a retornar e certificar-se seu provável engano era efetivamente, um engano. Afinal, não poderia ser Ela, àquela hora estaria há pelo menos 2300 km de distância, e mesmo numa hipótese completamente remota dela estar no Recife provavelmente estaria rodeada do seu tradicional séquito de amigos ou familiares. Mas seu coração acelerava, uma euforia inexplicável foi tomando conta dele enquanto se aproximava da figura feminina. Mais perto, ele pode ver sua pele alva, seu rosto encoberto por uma franja que caía encobrindo seus olhos. Era ela, repetia pra si, era ela.
- Selina?
- Eu!? Sim, eu. Você demorou hein!?
-Como assim, é você mesma Céu?
-Não, sou apenas um sonho. Respondeu ela num sorriso contido, ela parecia triste. Que mania a sua de diminuir meu nome, que já é tão curto, e me chamar de Céu, só você mesma. Completou num sorriso verdadeiro.
-Mas como pode ser você, aqui. Ele mirava fixamente o seu rosto, a franja ainda impedia de ver os olhos, ela pareceu perceber e com um gesto rápido de mãos mostrou todo sua face com seus olhinhos miúdos, mas levemente felizes, não obstante, ainda uma sombra permanecia principalmente em seus olhos, vermelhos, provavelmente havia chorado.
-Mas como você demorou hein?
-Como assim, eu nem sonhava que você estava em Recife, você não me disse nada, como esperaria me encontrar então?
-Ah Felipe, é claro que não iria te avisar, a simples idéia de ti ver me parecia ser ao mesmo tempo encantadora, mas também aterrorizante. Então não avisei e não pretendia te encontrar, no entanto, dei uma chance ao destino. Indagada como funcionaria o destino ela continuou explicando que resolveu ficar sozinha no ponto turístico mais famoso do Recife enquanto seus amigos circulavam pela cidade e se o destino fosse muito generoso provavelmente ela o encontraria exatamente como aconteceu. Só não imaginava que ela teria que esperar quase três horas pra isso.
-Você é louca mesmo!
-Ai, ai! O impressionante é você ter notado isso só agora. Disse ela num breve sorriso convidando-o a sentar ao seu lado. Olha Lipe, aposto que você esta pensando, afinal, se ela queria evitar encontrar-me porque esperou horas e horas sob os cuidados do “destino” só pra me ver. Pois vou te responder...
-Eu não imaginava-a tão falante. Interrompeu ele.
-Ah! Provavelmente é porque sou a garota dos seus sonhos, logo acabo sendo bem melhor que a original, o que acha?
-Uma boa teoria Selina dos meus sonhos, agora explique o que o destino reservou pra mim. Disse ele sorrindo, no entanto, o olhar dela se tornou muito grave, sua voz saiu doída, fraca.
-Estou perdendo as esperanças Lipe! O olhar indagador dele a fez continuar. De certa forma foi você quem me inspirou a arriscar-me a viver e sentir a vida em toda sua plenitude. A parar de pesar, calcular, relativizar e por fim desistir de correr qualquer risco. E guiada por este possível encanto de viver mergulhei no mar da vida, no entanto, poucas vezes pude sentir as águas plácidas e puras, até as sentia, mas por tão pouco tempo, o que predominou foram às procelas e tempestades que, às vezes, me fazia até pensar que iria afogar e desaparecer. Estou com medo, muito medo. Parece que a razão está vindo dentro de mim não só para me salvar de alguma desdita, mas para predominar e mandar em mim. Me ajuda! Dito isto ele pegou sua mão e mergulhou nos olhos dela e ambos ficaram perdidos um no outro, como se comunicassem em silêncio até que este foi quebrado pela voz dele.
-Se isto é um sonho não preciso me conter... Dito isto ele ergueu-a na amurada, tendo apenas agora ambos uma faixa de terra e o imenso mar do Recife, e a beijou, a princípio um beijo suave, terno, como se aos poucos as almas estivessem se misturando, fundindo. Ela estava na ponta dos pés, isto fazia com que o abraço fosse mais estreito, enquanto o beijo ia se tornando intenso, eufórico, delirante e agora as mãos que até então estavam repousadas simplesmente se espalharam pelos corpos, quase em desespero, como se um estivesse se afastando do outro e ambos tentassem segurar-se.
O celular gritava sem parar, foi quando ela lembrou-se que eram seis horas da tarde e os seus amigos estavam chegando. A noite se fez em Recife. Após o beijo eles ficaram mais um longo momento calados fitando-se de frente ao outro, ainda de pé.
-Era isso
-O que?
-Era isso que eu precisava Lipe, era isso, de alguma forma eu sempre soube, era você.
-Você tem que ir embora né?
-Você quer que eu fique, eu fico, basta você pedir, eu faço! Dito isto, sacou o telefone da bolsa. Você quer que eu fique, de verdade?
-Quero!
-Responda direito, porque não quero mais perder tempo. Você quer que eu fique?
-Quero, fica!
Ela deu um largo sorriso. Ele acordou!
by-Adriano Cabral
Por muitas ocasiões a vida está reduzida ao instante. A realidade que se desfaz em instante, transforma-se no sonho perdido da juventude. Certas ocasiões parecem mesmo não ter consolo.
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