domingo, 15 de agosto de 2010

Notas de amor 2 - O Ser e o Nada

 
      Quando Eulália veio ao mundo, não houve grito, choro, nem gemido. O médico teve que apelar para violência a fim de conseguir ter certeza que a pequena estava de fato existindo. No entanto, antes de tudo, ele pode ver os curiosos olhinhos de Eulália prescrutando-o como se quisesse através de um simples olhar, decifrá-lo. E assim seguiu Eulália, curiosa, pensativa, sempre ouvindo, observando, raciocinando e concluindo...ou pior, não concluindo... Mas definitivamente, aprendendo e desaprendendo, Sempre repetia: sou um ser em construção. Para ela, antes de tudo, tudo, mas tudo mesmo, era relativo.
      Eulália obviamente virou cientista e em sua avidez de aprender logo percebeu que as ciências exatas são exatas apenas no nome e na necessidade do ser humano de ter ao menos sob a guarida dos números alguma nesga de criativa e insana lucidez.
  Ela já passava dos vinte cinco anos quando um dia deparou-se com o seu maior desafio, tão grande que a teoria das cordas pareceria física clássica, tão desafiadora quanto entender o interior de um buraco negro. Tal desafio se apresentou através de estranhos suores e calafrios, coração pulsante em momentos completamente inesperados e frequente dificuldade para falar. Sem falar na constante, sim havia uma constante, que era pensar no seu colega de trabalho Roberto e quase sempre com isso ganhar um sorriso. Ela queria entender, e cada vez mais que tentava investigar tal fenônomeno mais ficava perdida. As ciências da natureza não conseguiam explicar a contento, ela apelou para as humanas, e depois de tanto laborar, nada concluía de forma lógica, diante disso, só restava-lhe a frustração. Enquanto isso Roberto cansava-se de enviar flores, mensagens e fazer-lhe convites para almoços, peças e jantares. Certas vez, acabrunhado com tantas recusas ele perguntou-lhe do porque de tanta rejeição, ela respondeu-lhe sorrindo: Ah! Não vejo razão lógica pra perder tanto do meu tempo com você. Eulália jurava que estava apenas sendo honesta e isso não era problema. Roberto ainda teve forças de indagar se ela nao sentia nada por ele, foi quando ele aprendeu que não se deve perguntar certas coisas a certas pessoas pois ouviu: Eu não sei, não tenho a mínima idéia, e sinto que não estou nem próxima de começar a descobrir pois cada resposta que obtenho parece mais absurda que a outra. Diante de tanta verdade Roberto simplesmente deixou de falar com Eulália, e esta definitivamente não conseguia entender porque.
Só se sabe que no dia do casamento de Roberto, Eulália passou mal, não foi trabalhar e chorou quase o dia inteiro. E, mesmo entendendo boa parte dos segredos do universo através da física quântica, Eulália sofreu por muitos anos e até hoje não sabe realmente porque. Só uma coisa ela entendia: desde então ela sentiu-se como se não mais existisse, um nada.

by- Adriano Cabral.

4 comentários:

  1. Há várias formas de sermos desonestos. No caso, Eulália era desonesta consigo mesma. Acho que ela não só deve ficar só como merece ficar só. Ao menos nesse caso. Nós colhemos o que plantamos.Básico.

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  2. Faz tempo que não comento aqui mas nunca deixei de ser seu blog, ja fiz inúmeros elogios mas hoje vou fazer uma crítica. Acho que já tá bom de textos com a temática medo né Dri? Segredos de um Ser Robotizado (medo de não ser amada) A primeira vista (Medo de prejudicar a garota) Almas Gêmeas (medo de se entregar e perder o controle) Medo (medo dos inseguranças babacas) e agora esse. Quando a gente te medo qualquer desculpa serve: Religião, trabalho, diferenças culturais, um antigo amor ou um que nunca existiu, não faz diferença. Foge-se. Isso ta em músicas e poemas. Como você mesmo já disse uma vez: Para amar precisa-se antes de tudo coragem e fim.
    Esqueça o medo meu ídolo, escreva sobre coragem.

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  3. Saber, saber, saber quem não quer saber os segredos do universo?, queremos entender o mundo a nossa volta para de alguma forma nos sentirmos mais seguros, para nos protegermos, mas é tudo uma ilusão, não existem escudos que nos protejam contra nós mesmos, mas admitir essa realidade é assustador, entender que não há um chão onde se pisa, que basta um passo para cair, entender essa fragilidade da vida é assumir que não há ciência capaz de criar escudos, mas somos teimosos e movidos pelo medo procuramos nos livros métodos capazes de evitar a nossa queda, ah mais que tolos que somos ao exclamar -mos desdenhosos do amor, encontrei!, o que encontramos não foi ouro, foi cimento, colamos nossos pés ao chão não caimos, não andamos, não vivemos.
    Eulália cimentou os pés no chão, e mesmo assim não evitou a dor, o cansaço de se manter a mesma postura de ser fiel ao que lhe é comum foi demais e enfim o chão que ela criou cedeu diante das suas angústias. É triste perceber que mesmo com tanta ciência ela não se deu conta que se por um lado bastava um passo para cair, era também somente o que lhe faltava para voar.

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