Há histórias e estórias, e esta que vou contar é uma história com H maiúsculo. Não obstante já ter se passado tantos anos, lembro-me quase como se fosse hoje essas minhas aventuras e resolvi compartilhar com quem por ela se interessar.
Tinha seis anos, filho único, meus pais eram professores e minha casa, apertada naturalmente, diminuía mais ainda num mar de livros, folhas, cadernos e provas. A coisa mais comum do mundo era vê-los lendo, seja um livro ou no computador. Nas minhas primeiras recordações como membro da raça humana era da minha mãe, deitada na cama comigo, lendo-me histórias. Portanto não é surpreendente que aos seis anos de idade tivesse mais de cem livros lidos e relidos. Meu pai era um gigante de um metro de noventa, olhar sério, voz grave e poderosa, no entanto com espírito tão jovial e infantil que às vezes sentia-o mais como um irmão mais velho, ou ás vezes, mais novo. Não é por acaso que no dia dos pais disse-me em "segredo" que eu deveria pedir a minha mãe que lhe desse o jogo das Crônicas de Narnia. Ao invés do jogo veio um "monstruoso" livro de mais de 750 páginas, a coleção completa da série que dera origem ao jogo. Tanto minha mãe quanto meu pai tentou em vão despertar meu interesse pelo "monstro". Mas era difícil, afinal, como se pode ler um livro que além de infinito não possue gravuras? Por mais que ficasse curioso com o destino da mãe de Digory (Personagem principal do primeiro livro da Série: O Sobrinho do Mago) aquela profusão de letras sem os atrativos desenhos não prendiam minha atenção.
Até que um dia, de repente, meu pai informou-me em tom solene que descobriu na internet um concurso mundial chamado "A Lista de Narnia". O link ainda no ar aqui: http://leitores.narnia.zip.net/. Os dizeres estavam claros: Quem vencesse o concurso ganharia o melhor brinquedo que os pais podiam comprar e o último lugar seria banido para viver em Narnia para sempre. Ao ler aquilo me dominou tanto à aflição quanto à tentação de participar de tal aventura. Meu pai já havia decidido por mim, disse-me que me inscrevera no concurso, assim como ele mesmo inscreveu a si e minha mãe. Diante da fatalidade fui correndo pegar o grande tomo. Desde então não o largava, não raro levava-o para escola, jogo de futebol, natação, e é óbvio, dormia com ele; Às vezes lá se iam mais de 40 páginas no mesmo dia. Como se tratava de um concurso e o prêmio, qualquer um de vocês reconheceria, era sobejamente atraente, quando não podia levar à escola escondia o livro (As professoras já estavam preocupadas, porque uma criança tão jovem lia tão sofregamente um livro tão volumoso). Afinal, meu pai e minha mãe eram ferrenhos e perigosos competidores.
Enquanto Caspian singrava os mares místicos com Lúcia e Edmundo (Protagonistas do Peregrino da Alvorada) eu digladiava com meus pais para terminar o mais rapidamente o livro. Todos os dias a lista de Narnia era atualizada. Os meses seguiam e eu não conseguia nem chega perto do topo da lista. Fiquei quase sem dormir algumas noites, pois, minha mãe que era excessivamente ocupada, não lia com freqüência, e como eu mal largava o tomo, diante disso ela ficou por várias semanas em último lugar. Imaginem só o terror que me tomava só de pensar que ela poderia ser banida para Narnia eternamente? Mesmo diante de um grande conflito, por vezes, abria mão de minha leitura e entregava o livro para minha mãe.
Os meses se passavam, as páginas também avançavam, cheguei a figurar entre os dez melhores leitores, no entanto, nada de chegar ao topo. Muita vez pensei em abandonar a guerra, fatigado de perder tantas batalhas. Nesses momentos meu pai mostrava-me os comentários dos competidores zombando de minha tibieza, ou se orgulhando excessivamente por estarem no topo da lista, ás vezes até escarnecendo da minha capacidade de leitura. Tais provocações renovavam em mim a força para luta. Eustáquio e Poly lidavam com os problemas do caldeirão de prata e eu caminhava para última batalha. Sempre me perguntava como as pessoas do site sabiam em que ponto cada competidor estava na leitura...
E foi nessa dinâmica que passados sete meses consegui concluir o livro. Fui o primeiro da família. Corri para o Site, mas não havia nenhum resultado. Na listagem mais recente estava em quarto. Minha mãe intimou-me a ter mais fé em "Aslam"(Representa a figura de Deus em todos os livros da série). No dia seguinte acordei com os gritos dos meus pais conclamando-me a ver o resultado final da competição e para minha tristeza, fui segundo lugar. Estranhamente eles me parabenizaram como se campeão fosse, eu sorria amarguradamente, não entendia muito bem o porquê de tanta festa para um derrotado. Foi aí que eles disseram que mesmo em segundo lugar eu teria o prêmio do primeiro, ou seja: Qualquer brinquedo que os pais pudessem comprar. E logo relembrei desses meses de aventura, suspense, drama, comédia, e tanta diversão que os sete livros narnianos me proporcionaram, não podia pedir outra coisa, para felicidade do meu Pai recebi como prêmio o jogo das Crônicas de Narnia.
Anos depois foi que percebi que muito antes de chegar à última página já havia recebido o maior prêmio que uma criança poderia ter: Meus pais. Só mesmo pais como eles poderiam ter tanto espírito, tanta paixão e tanto amor para criar na minha infância uma memória ao mesmo tempo tão instrutiva, divertida e é claro, mágica.
E se não é mais possível estarmos todos juntos nesse mundo, após a última batalha, com certeza, estaremos unidos no céu de Narnia.
By- Adriano Cabral.
Ótima História, Adriano!
ResponderExcluirMe trouxe lindas recordações e uma certa nostalgia da minha própria infância! Impressionante como você torna um texto, a primeira vista cansativo de ler, numa deliciosa jornada! Posso estar errada, mas essa história me fez refletir sobre o que é a infância atualmente. A grande maioria das crianças que conheço não têm pais tão presentes e incentivadores como no caso dos meus, acredito que dos seus e os desse texto, infelizmente. Obrigada por nos presentear, logo no primeiro dia do ano, com mais uma das suas belas obras!
Nossa! mais que presente me delíciar com este texto! Logo no dia 1º de 2010 e que ganhei de Natal justamente o livro As Crônicas de Nárnia Volúme único. Estou lendo incansávelmente estava lendo agora mesmo. Fico pensando em como a leitura e a infância estão sendo desvalorizadas e os pais não são tão presentes como os meus são minha família é realmente o maior presente que Deus me deu!
ResponderExcluirque texto sublime,ao ler entrei no intimo de minha infância e relembrei dos livros que lia,especificadamente meu 1° livro uma enciclopedia ilustrada do estudante,ali conheci tudo do mundo sem sair do lugar,me deu vontande de escrever...vou indo..rs
ResponderExcluirvou seguir o blog..adorei!
Não irei te entregar, mas posso dizer que seu texto é genial! Com mais essa me surpreendeu! Aonde vc vai parar ein ? :)
ResponderExcluirAdoro seus textos, sempre uma surpresa a cada linha lida. Esse de Narnia trouxe lembranças da minha passada infância, dos livros que li, as histórias que meus pais me contavam não só na hora de dormir... Enfim, continue sempre assim Adriano.
ResponderExcluirPais, pais.. certos, errados, doces, rígidos..
ResponderExcluirMas são sempre nossos pais.
Dizem que tem muita coisa que só iremos entender quando tivermos nossos prórprios filhos. Talvez você já entenda muitas, então..
Que sorte tê-los. Mais sorte ainda ter ambos vivos.
E para quem não os tem mais, que cultive todo o amor por eles, nos filhos.
Lindo texto, como sempre!
Smack!
Lindo texto, Adriano! Com ele relembrei aqueles divertidos meses que, juntos, fizemos Dianinho (e nós mesmos)viajar pelas terras de Nárnia. Não estaremos mais sob o mesmo teto para repetirmos a dose ou invetarmos novas formas de diversão para o nosso filhote, mas certamente nós três continuaremos ligados pelo forte laço de amor que Dianinho representa e que nos une para o resto de nossas vidas! Que o ano de 2010 seja mais feliz para todos nós!
ResponderExcluirRealmente um belíssimo texto. Parabéns como autor e pai, né. Dianinho é um garoto agraciado por ter pais como os que tem, e seguindo seus exemplos não poderia ser menos esperto e inteligente do que é.
ResponderExcluirBom seria que todos os pais fossem como vocês, grandes incentivadores da leitura. Ah! E depois desse texto deu até vontade de ler...
Entre estórias e histórias, também vou para as com "h". Seu filho tem sorte. Adorei o texto. Comos eria bom se as motivações ao lúdico e à leitura fossem assim.
ResponderExcluirE você conseguiu dispertar minhas leituras com as crônicas.
Beijos, lindo professor!
Veri.
Muito boa essa história. Pena que país criativos são raros. Sou escritor Falo do Rio de Janeiro. Meu email marcelinovips@hotmail.com
ResponderExcluirwww.marcelinorodriguez.wordpress.com
Nossa!! Coincidencia!! Foi as cronicas de narnia que me fez gostar da literatura ... A diferença é q eu começei com 9 anos ... O mesmo volume unico ... 750 paginas !! E agora eu tenho 11 anos :)
ResponderExcluirmuito legal o seu texto, lindo....Nossos pais sao os melhores amigos da gente, isso tenho certeza
ResponderExcluirPoxa, tu conseguiu me fazer lagrimejar na parte final em q fala dos seus pais. Que privilégio crescer com os pais juntos e unidos!
ResponderExcluirAcabei de comprar o livro! Não vejo a hora de começar a ler, e olha q na minha casa tem uma fila!!! rsrsr...
Como gostei de ler esse texto...
Deus te abençoe muito Adriano, assim como tu me abençoou agora!
Abração
São Luis- MA