AVISO: Antes de ler este texto leia a primeira parte logo abaixo.
—Como? Repetiu friamente a voz de outra lado da linha.
—Não faz isso comigo! Retrucou, dolorida a outra voz quase sumida.
—Não sejamos ridículos, isso não cabe mais, não sejamos ridículos.
Ridícula foi aquela cena na praia. Se portou com uma garotinha chorona. Que grande figura deve ter parecido para ele. Uma louca! Mas de verdade, daquelas que só se encontram na Tamarineira. Sabia que a sua falta de experiência seria prejudicial ao encontrá-lo, deveria ter feito com Florentino Ariza que colecionava amantes de verdade e não só “ficadas” de adolescente, assim estaria melhor preparada quando o encontrasse. As suas palavras tiveram a força de um raio que despedaçou completamente num só golpe a porta que dava acesso a sua alma. Ela se sentia ainda forte, mas nunca tão frágil, nunca tão indefesa no mundo, e pela primeira vez descobriu o prazer de não ser independente. Mas eram muitos sentimentos se contrapondo e o medo da rejeição vinha junto ao gozo daquelas setas de cupido desferidas em poucos segundo, seria ela merecedora? Não! Não! Era ele sim, e se ela estiver correta, por mais desatinado que tenha sido seu comportamento ele voltará.
E o telefone emudeceu, e agora restou um nada, uma dor que crispava seus nervos, gelava sua alma. O desespero imperava. Ligou novamente, agora alguém teria que ouvir tudo que tinha para dizer.
Cada beijo a enlouquecia mais, ela se deixava comprimir pelo abraço forte dele, cada beijo era depositado num lugar diferente de seu corpo, cada um era lento, suave, uma reverência, forte como um golpe de morte, intenso ressuscitando a alma. Cada beijo era como uma nota musical transformada num gemido, cada uma fazia descobrir um novo significado para o prazer. Ela, totalmente entregue, permitia livre acesso para mãos que exploravam com maestria caminhos nunca antes conhecidos por homem algum. Cada toque um desespero, explosão de desejo, abria um novo caminho, e ela fazia de tudo para deixar as trilhas mais acessíveis. Não havia outra coisa a fazer senão permitir, o tudo, naquele ritual magnífico de amor. Algum tempo depois, ficou se perguntando como ele conseguia fazer tanta coisa num espaço tão pequeno de um automóvel. Repentinamente ele parou. Ela nada falou, puxou-o para si com violência, queria mais, queria que aquele momento fosse eterno ou que sua vida fosse ceifada ali, assim, poderia morrer feliz. Ele disse que era melhor parar. Ela ficou possessa, que absurdo era aquele? Que loucura! Porque parar? Indagou ainda ofegante.
— Eu te amo e te respeito, mas você é apenas uma garotinha. Disse ele em voz baixa ainda ofegante.
A resposta de Daniela foi um tapa que desferiu com toda sua força no rosto de Alex. Este permaneceu da mesma forma que estava, com o olhar desolado. Após a agressão, nada disse, apenas deu partida com o carro. Parecia não dar importância às súplicas dela pedindo perdão. Ela já não era a fortaleza e a serenidade encarnada que conhecíamos a algumas linhas atrás. Era dele, uma coisa dele, e se orgulhava disso. Só sentia o desespero ao imaginar que poderia perdê-lo de repente. Em seus 15 anos de vida jamais tinha sido tão feliz. Alex estava com ela o dia todo, e até mesmo em seus sonhos. Tudo isso ela repetia para ele, dizendo que se ela era ainda uma menina, seria sua menina, e ele seu papai de 23 anos. Não era a primeira briga por esta razão. Mas até aquele momento ela nunca havia partido para as vias de fato. Se eles se amavam porque não poderiam consagrar seu amor naquela cópula que com certeza seria abençoada por Deus? Ao dizer isso seus olhos brilhavam tanto que não foi possível impedir o que aconteceu em seguida, o carro ainda estava em movimento enquanto ela punha as mãos nas coxas dele, em movimentos contínuos e ida e volta, até que suas mãos foram e enfim se detiveram, segurando algo quente, firme, úmido e macio. Os olhos dela ardiam, e após encontrar os dele, aflito no volante ela o beijou tão lascivamente que o carro quase bate na calçada. Ele não resistiu e encostou o carro em qualquer lugar e na cidade do Recife começou a chover torrencialmente enquanto o fogo ardia num automóvel em alguma rua escura.
— Eu já não te disse para não ligar?
— Olha, pois agora vou te punir....
— Isso não é normal, não é sadio, acabou entende? Acabou!
— Olha que agora vou te punir
— Vou desligar esta merda de telefone e não quero que você me ligue nunca mais...
— Nunca mais... com certeza, você quer que eu atire no peito, na boca ou na barriga?
— Isso realmente é coisa de maluco? Como é que pude me envolver com alguém como você.
— Ontem eu era tudo para você... minha loucura te encantava, mas cansei, vou matar nós dois e acabar o sofrimento, e tudo realmente ficará perdido...
— Para com isso! Que coisa, seu draminha pessoal não irá me comover...
— Perdido...
— Tenha dignidade...
— Dignidade... dignidade... preciso de dignidade...
— Pô! Tou chorando de novo... nunca pensei que iria chorar por alguém.... ainda mais por você... Só lamento que ninguém vai saber de toda riqueza que nós temos, de toda uma vida linda e particular que existiu... e você agora, jogando tudo fora... mas você vai sofrer, pois, se vamos morrer, a culpa é toda sua...
— Sabe de uma coisa, você não quer se matar? Atira logo e me deixa em paz....
(estampido) de um lado um grito, de outro um estremecimento.
—Ah! Estamos morrendo.... estamos morrendo....
—Deus! Será que sua loucura é real? Você fez mesmo?
Era como todas as manhãs do mundo. E quase ninguém no planeta saberá do drama que acabara de se passar. Não saiu nenhuma nota do jornal. Ao chegar em casa e ver o corpo inerte, com os olhos esbugalhados e encharcados de sangue, só restaram aos pais chorar a morte da cria querida.
— Nós não devíamos morrer... não é just...
(entre soluços a voz sumiu)
Era como todas as manhãs do mundo. E quase ninguém no planeta saberá do drama que acabara de se passar. Não saiu nenhuma nota do jornal. Ao chegar em casa e ver o corpo inerte, com os olhos esbugalhados e encharcados de sangue, só restaram aos pais chorar a morte da cria querida.
Era como todas as manhãs do mundo e se, um dia após a morte do amor, você pôde caminhar na praia de boa viagem as 6:00 da manhã, viu mais uma vez uma menina ajoelhada na areia orando por alguém que não quis esperar o trem das sete, e partiu. E mesmo diante do sol majestoso que saudou as águas com seu tradicional espetáculo multicor, vista ao lado da menina, estava uma enorme vela acesa, pois dizem que só ela pode iluminar o caminho dos suicidas ao paraíso.
Era como todas as manhãs e mundo, e eu era a menina na areia, pensando na minha pobre amiga Daniela que sonhou e pagou tão caro preço do sonho e após duas horas, sozinha, sangrando em agonia, desapareceu da terra e agora estava deitada, para sempre, misturada na areia do esquecimento. Somente para ela, morreram todas as manhãs do mundo.
By-Adriano Cabral
05/10/00 9:00 Am
Um texto realmente bem feito! Interposição de diálogos, atemporalidade... Sem falar que ele cortou o texto 1 no momento certo de deixar o leitor esperançoso... rs
ResponderExcluirO conteúdo então... nem se fala! =D
Triste e tão lindo. Lindo.
ResponderExcluirQue triste, Adriano... =(
ResponderExcluirUm texto muito bem construído, com certeza...E acredite se quiser, existem muitas "Danielas" no mundo.. E eu até connheci uma. As admiro pela coragem e intensidade do amor que possuem.. Triste é saber que muitas vezes não há correspondência de tal sentimento.. Mas, a vida continua.. e nós, ao contrário de Daniela, ainda temos todas as manhãs do mundo..
Smack.
Realmente muito bem escrito. E o final arrepiante. Acho que a personagem estava ansiosa demais para encontrar seu "amor", vivia de menos e sonhava demais, essa combinação raramente acaba em algo bom...mas como saber? Só, vivendo, de preferência aprendendo a perder e mesmo assim sobreviver.
ResponderExcluirAdorei o blog! Só tem coisa boa! Parabéns.
Sinceramente? A situação retratada no texto está longe de ser amor, mas sim uma paixão doentia, um sentimento possessivo.
ResponderExcluirNão obstante, é um ótimo texto.
Concordo em termos com o anônimo. Transformou-se numa paixão patológica, contudo, toda paixão é posessiva, umas mais outras menos, mas TODAS SÃO. Por mais que queiramos bancar os "descolados" não queremos dividir nosso parceiro com ninguém nem nos permitimos a tal (claro, em tese rs) o fato da relação acabar não elimina o sentimento de posse automáticamente, isso seria muito artificial. A propósito o texto foi inspirado em fatos reais.
ResponderExcluirMuito emocionante e bem escrito. Concordo que a situação chega ao ponto de obsessão, à doença mas nem por isso deixa de ser real, ou melhor, por isso, se torna mais real.
ResponderExcluirsmack.
Bom já lemos esse texto não é?, se eu fosse Daniela, não me mataria, que fim teria isso?, entendo até se ela estivesse sofrendo demais e se matasse para acabar com o sofrimento, mas o objetivo maior dela não era o estar com ele?, sofrimentos a parte, se matar não é um bom plano para atingir esse objetivo, é apenas desistir, o texto é emocionante, mas a personagem é burra e desiste facil demais, a vida é muito mais que isso... vai entender pq alguem desiste tão facil de alguem que lhe parecia tão importante, e outra coisa forçar alguem a estar com vc?... se ele não queria mais, força-lo a isso não iria adiantar, ela deveria ter tentado conquista-lo, mas por outro lado dizem que quando tudo falha as pessoas apelam para o desepero, mas ainda assim essa não exatamente, uma medida desesperada muito boa, desespero vendo em retrospecto, nunca será uma atitude muito boa... pobre daniela, talvez ela amasse mais a ideia de ter um ser amado, de sentir tal sentimento, do que do objeto do proprio amor, por isso força-lo a estar com ela não parecia loucura, afinal não era dele que ela gostava, ela se apaixonou pela ideia de estar apaixonada, e nesse caso até que faz algum sentido esse plano de se matar...
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