Este é mais um daqueles filmes que "ninguém vê", nunca ouviu falar e a gente acaba vendo por acaso. Quem não viu o filme e estiver interessado em vê-lo e aprecia o “suspense”, acho melhor não lê as próximas linhas. (tudo bem que até agora não tive nenhum leitor rs).
Helmut inicia o filme comentando como ele identifica um "cara comum", este seria encontrado nas praças, pontos de ônibus, nas ruas, sempre parado, fingindo fazer algo, mas na verdade apenas observando e assistindo as pessoas. Ao ser observado, o cara comum rapidamente baixa a cabeça e finge não esta olhando...Afinal, ele tem vergonha de si mesmo, ele é apenas um "cara comum".
E, logo no início de filme vemos flashs de toda vida do personagem Helmut, de como ele deveria ter "Aprendido a Mentir" antes, assim talvez, segundo ele, sua vida teria sido melhor. Os flashs voam do passado até a última cena, onde Helmut identifica nele mesmo apenas: Um cara comum.
Ele aparentemente é um zumbi humano incapaz de sentir algo, de entender o que faz, porque faz e na verdade parece não estar exatamente interessada nisso mesmo. Trechos impagáveis do filme:
Trecho.1- Helmut arranja uma namorada que mora com uma amiga de nome Bárbara. Helmut depois de meses morando com as duas resolve convidar Bárbara a fazer sexo, esta, tão ou mais zumbi que ele diz sim e marcam o dia. Durante as cenas de sexo Helmut reflete que o sexo com Bárbara é ruim, nojento, asqueroso, sujo e decididamente acha excitante tudo isso. Ao transar com a namorada no mesmo dia descobre a diferença entre fazer amor e fazer sexo.
Trecho.2- Helmut acaba de fazer sexo com Bárbara, ambos deitados na cama, subitamente a namorada dele chega na casa chamando seu nome, o primeiro impulso dele é pular da cama, mas o que ele efetivamente faz é ficar lá...Esperando ser flagrado. Após o flagra segui-se mais ou menos o seguinte diálogo:
Namorada - Você não pode mais morar aqui, esta tudo acabado entre nós.
Helmut - Tudo bem!
Namorada indignada - Tudo bem? Você nem tenta explicar o que aconteceu, porque você fez isso, você ama Bárbara?
Helmut- Não!
Namorada- Então porque você fez isso?
Helmut- Não sei!
Namorada- Você me ama?
Helmut- Não sei.
Namorada- Então suma daqui.
Da mesma forma, ao ser anos mais tarde, informado por uma nova namorada que esta grávida, Helmut foge e durante a fuga reflete que a amava, queria casar com ela, desejaria até um filho, mas não sabia porque, a única coisa que ele queria naquele momento era...Partir.
Este modo de agir peculiar tem uma razão de ser, e para entender-se tem-se que se voltar no tempo, e o filme faz isto.
E lá esta ele nos anos 80, adolescente, fascinado por uma loira misteriosa que além de aparentemente bem inteligente, é uma popular representante estudantil e que virá a ser primeiro "grande amor", seu nome Britta. Ela estranhamente parece também interessada em Helmut e resolve decididamente se "apropriar" do mesmo. Ele a segue onde quer que ela queira, obedece á todos os seus pedidos e sugestões, e em troca disso, durante um bom tempo terá como recompensa apenas companhia da loira. Até que aparentemente sem nada de espetacular ter acontecido, a loira resolve beijá-lo e os dois, além de trocarem carícias, repousam na intimidade do quarto da jovem. Entretanto, logo no dia seguinte Helmut, nitidamente feliz e apaixonado é totalmente ignorado pela amada. E mesmo sem admitir, o nosso herói está totalmente cativo, tanto que, após ficar horas ao lado do telefone recebe uma ligação de Britta que o convoca para um bar e lá comunica deseja namorá-lo, desde que ele não conte para ninguém, o que ele prontamente aceita. E "magicamente” no dia de natal faz amor com ela. Nesta mesma noite ela informa que sairá do país e deixa claro que não há possibilidades de mais nada existir entre eles. Os anos vão passando e, não obstante Helmut não admitir nem para si mesmo, após esse romance frustrado toda sua vida perde literalmente sentido.
Uma das coisas que mais achei diferente nesta história (que não deixa de ser uma grande história de amor) é que Helmut aparentemente ignora a fonte de seus problemas, na verdade ele reluta até a aceitar que tem problemas. E enquanto isso vira e mexe ele busca novamente Britta e no processo vai descobrindo que a mesma possuía vários amantes na mesma época que o “namorava” fazendo sexo com todos, ela é cada vez mais desconstruída e desmistificada até chegar ao ponto em que no final do filme, após abandonar a namorada grávida para novamente encontrar Britta, abandona esta sem dizer mais nada além de identificá-la como “apenas uma pessoa comum” e identificar a si mesmo como apenas um homem comum. Neste momento em que encara seu mito, confronta-o, desmistifica, ele está pronto para ter um relacionamento comum com sua companheira grávida.
É um filme de amor diferente do estilo comum, mas com os mesmos objetivos, destacar o essencial que existe nas relações humanas. Há uma passagem emblemática do filme que eu adorei na qual Helmut, já trintão, visita o bar onde teve o primeiro encontro com Britta numa noite de natal. Nisto o Barman conta que há um homem que vem faz 15 anos naquele bar onde conheceu sua primeira namorada e com ela teve sua primeira relação amorosa. Informou ainda que o homem de alguma forma espera rever a garota como se isso fosse realmente importante. Filosofa o Barman que o homem entendeu tudo errado, o que ocorrera de fato há 15 anos foi um milagre e o autor deste milagre foi o homem, e não a mulher. Foi ele quem vivenciou e sentiu tudo de mágico e espetacular naquele momento. Poderia ter sido qualquer outra mulher o importante mesmo era que, naquele dia, naquele momento, o homem estava realmente disposto a sentir e viver tal milagre.
Talvez uma das conclusões que podemos tirar disto tudo é que ás vezes mistificamos algo a tal ponto que isto pode comprometer toda nossa vida, mesmo que essencialmente, esse algo fosse quase irrelevante. E de outro lado, no final das contas, todos somos apenas... Pessoas comuns.
Título Original: Liegen Lernen Gênero: Comédia Romântica Tempo de Duração: 87 minutosAno de Lançamento (Alemanha): 2003Site Oficial:
http://www.liegenlernen.de/
Adriano Cabral